segunda-feira, 8 de abril de 2019

Cortar a pele para aliviar a tristeza





Todos nós enfrentamos problemas diariamente. Uns simples, outros mais graves e que demandam mais tempo e energia para resolvê-los.  É parte do nosso viver. A diferença está na forma como encaramos cada um deles e, consequentemente, nas dores que eles provocam. Porém, apesar das dores, no fundo sabemos que as soluções não são automáticas, mas são possíveis.

Assim, não é fácil, para a maioria das pessoas, compreender a automutilação, um comportamento que envolve agressão ao próprio corpo, porém sem intenção de suicídio.          

O distúrbio acontece de várias formas como cortar, arranhar, queimar ou beliscar a própria pele, bater em si mesmo, puxar o próprio cabelo, até engolir objetos perfurocortantes. Tais cortes ou agressões geralmente são feitos em regiões do corpo que podem ser escondidas pela roupa. Por isso que não dá para dizer que este comportamento é só uma forma de chamar atenção, do contrário as lesões seriam visíveis e não escondidas.

A automutilação tem a função de promover alívio diante de situações de ansiedade, raiva, sensação de vazio e sofrimento emocional. Alguns realizam o ato sem pensar, enquanto outros são claramente planejados, mas que ocorrem sempre no quarto ou no banheiro, longe dos olhos dos outros. Os comportamentos geralmente são caracterizados por um quadro de personalidade um pouco mais impulsiva ou emocionalmente instável.

Alguns relatam que provocar a dor física é uma maneira de reduzir significativamente a dor psíquica, numa espécie de troca, onde a primeira seria mais tolerável que a segunda. No entanto, o alívio é momentâneo e quando o incomodo ressurge, ele volta a se autoagredir, tornando o ciclo vicioso.

E por que um adolescente, ou uma criança, se cortaria? Os motivos são variados, mas a dificuldade de compreender, de nomear os próprios sentimentos, ou enfrentar as situações adversas da vida, é a base. Os automutiladores tem baixa autoestima, são retraídos, mesmo que algumas vezes mostram-se alegres, e mantém certo distanciamento dos relacionamentos sociais. A maioria se isola

 A adolescência é um período caracterizado pela busca da aceitação do grupo de amigos, que ditam as regras de como se comportar, etc. Logo, adolescentes um pouco mais frágeis do ponto de vista emocional, podem aderir a esses comportamentos em grupos que valorizam este tipo de ação, como forma de pertencimento.

Por isso, os especialistas fazem uma clara associação entre automutilação e bullying.  Adolescentes, ou crianças, que sofrem ou sofreram bullying de forma intensa, encontram na automutilação uma forma de diminuir a angústia, a tristeza e o isolamento social, quando não são aceitos por algum grupo.  E sem a aceitação do grupo nesta fase, a autoestima desaba e o efeito pode ser devastador.

Há ainda outros fatores que podem contribuir para a automutilação como quadros depressivos mais graves, transtornos de ansiedade, discórdias familiares e até mesmo as redes sociais, pois estas dificultam a visão clara de que a felicidade exposta ali são elementos idealizados de ser, com fotos editadas e que correspondem apenas a um momento da vida daquela pessoa e não a vida da pessoa em si. Só que um  adolescente vulnerável emocionalmente não terá este pensamento crítico e, possivelmente, pensará que só a vida dele é ruim.

A família desempenha um papel fundamental. Os pais costumam dizer que seus filhos sabem que podem contar com eles diante de qualquer dificuldade, só que, muitas vezes, esta relação de confiança, de intimidade, não é praticada diariamente como deveria ser, ou seja, marcada por expressões de afeto e confiança.

Geralmente os pais nunca desconfiam da automutilação e quando descobrem, na maioria das vezes  através da escola, ficam chocados e perplexos. Por isso que a família e a escola devem atuar em conjunto e de maneira preventiva, pois esses aspectos não devem ser olhados apenas quando o problema se instala. É preciso acolher estas crianças e adolescentes, no sentido de compreendê-los e incentiva-los a expressarem o que sentem.

A psicoterapia também é fundamental uma vez que é um espaço onde estes jovens possam expressar suas dores e angústias, buscando formas mais saudáveis de lidar com as mesmas.

Autora: Joselene L. Alvim- psicóloga



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